Eu me lembro de ter começado relativamente cedo e aos poucos.
Fiz minha primeira junção de consoantes e vogais entre os 5 e 6 anos, em casa (na enorme área de serviço que eu usava para brincar), com giz de cera laranja, no verso de um envelope verde de cartão de natal.
Pela lógica do que eu havia visto em algum lugar, se eu unisse o P com o A, eu teria PA. O mesmo valia para o T unindo-se ao O. Logo, eu construía PATO.
Na minha ingênua simplicidade, eu fui adotando essa regra para tudo o que eu entendia como palavra possível. Pouco tempo depois, o outro lado do envelope já estava completamente tomado por inúmeras palavras similares: PATO, PATA, GATO, GATA, MATO, MATA, RATO, RATA, LADO. Eu incluía também os opostos femininos e masculinos das junções que eu acabara de construir. Era um modo de ter mais palavras para mostrar a quem quer que fosse.
Essa memória ficou gravada em mim porque nela eu tive uma das minhas primeiras experiências com a escrita. E nela, eu me sentia orgulhosa de mim.
Tão orgulhosa que na mesma semana, levei o tal envelope cheio de palavras para a casa da minha avó - o melhor lugar do mundo para mim naquela época - e exibi meu feito para todas as pessoas que moravam ali.
Pode parecer tardia a minha experiência com a construção dessas palavras tão simples. Hoje em dia, especialmente, uma criança com bem menos que isso já sabe a funcionalidade de um computador, um celular ou um tablet. A maioria, inclusive, entra muito cedo na escola.
Eu me lembro de ir para a pré escola, me lembro do cheiro da sala de aula e de alguns rostos que consegui manter comigo até o final da adolescência. Mas eu não me lembro efetivamente das aulas e do que eu aprendia. Talvez por ser desde muito pequena o tipo de pessoa que vive presa no próprio mundo ou em qualquer planeta que não seja necessariamente este onde eu nasci.
Assim como a construção das palavras com giz laranja no envelope verde, quase toda a minha vida foi assim: recebendo orientações mas encontrando meu próprio momento para colocá-las em prática.
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