THERE'S NOTHING YOU CAN MAKE THAT CAN'T BE MADE.

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sábado, 28 de julho de 2012

Memórias

"- Alô? Alô, Rubem... Ligaram da escola da Julia, ela não ta se sentindo bem. Pediram pra você ir buscá-la.
- Tudo bem. Pode deixar que eu já vou pra lá.
- Você demora pra sair do escritório?
- Não, vou agora mesmo. Depois eu volto e resolvo o restante das coisas."

 Eu enxergava claramente pelo vidro da janela, enquanto ele estacionava o carro e seguia em direção à secretaria da escola. Batia no vidro, pedindo que alguém o deixasse entrar e finalmente me apanhava, e me salvava do que quer que eu estivesse sentido. As dores e mal-estares começaram logo na minha primeira infância. Como a criança frágil que eu era, sequer conseguia conter uma dor de estômago sem que pra isso precisasse tomar algum medicamento, ou passar o dia em repouso. Tendo consciência de algumas circunstâncias em casa, sabia que seria bem cuidada na casa dos meus avós de criação; a única família de avós, tios e padrinhos que conheci de fato, e cujas quais aprendi valores morais que me cercariam pelo resto da vida. É uma das lembranças mais bonitas que tenho, e sei que se pudesse checar os cadernos de saída emergencial da escola onde estudei, as assinaturas dele estariam todas lá. E ele o fazia, sem sequer reclamar, ou exitar. Não me lembro de uma só vez em que tenha me negado algo que eu pedisse. Sequer levantava a voz pra mim, mesmo no estágio mais teimoso da minha infância, não era o suficiente pra fazê-lo perder as estribeiras comigo. Tinha o hábito de comprar junto ao pão diário, chocolates com desenhos em alto relevo, que ele costumava chamar de "surpresa" pra depois do jantar. Possuía manias divertidas, típicas de um senhor de idade que as preservava desde muito tempo. Molhava a banana nas lasquinhas que sobrava de pão na mesa, e cantarolava alto suas músicas preferidas, sem temer se os outros vizinhos lhe ouviriam. E assim eram todos os dias. Todas as manhãs, tardes e noites. E mesmo após um ano, ainda sinto que o verei adentrar pela porta de madeira da sala, dizendo sorrindo: "Oi, gentêm!". Ele faz falta, ainda faz falta.