THERE'S NOTHING YOU CAN MAKE THAT CAN'T BE MADE.

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quinta-feira, 30 de junho de 2016

A certeza incerta de que você sempre retorna - Sobre amizades que resistem ao tempo

Eu subo na sua garupa. Seguro firme, sem medo.
Resisto aos pingos ardidos de chuva que batem no meu rosto enquanto a viseira continua aberta.
Se eu fechá-la, não ouvirei o que você tem a dizer - E eu sempre gosto de tudo o que você diz.
E gostar das suas palavras me soa ridiculamente natural. E terrivelmente familiar.
Você fala sorrindo. Eu sinto o sorriso atravessando o capacete e então compreendo a razão de tamanho afeto - provido de tantos anos.
Eu sento ao seu lado depois de mais uma garrafa de cerveja. E nós questionamos a humanidade, discutimos a política atual do país, rimos do passado, assumimos verdades doloridas.
Desafiamos o tempo.
O tempo deste plano e de qualquer outro, por estarmos ali e sermos exatamente o que somos: Dois amigos. Um par de criaturas curiosas em busca da felicidade plena - felicidade essa que praticamente se materializa quando completamos a frase um do outro e, em seguida, debochamos da nossa incrível capacidade de entendimento.
Eu volto acompanhada pela boa sensação que me envolve depois de te ouvir falar incessantemente. Você me chama pelo apelido carinhoso de sempre pouco antes de se virar e seguir. Sem me prometer voltar. Sem precisar de qualquer certeza.
Porque somos um pouco do mundo e um bocado de nós dois. Porque eu não preciso te assegurar que te guardo e te zelo mesmo em pensamento. Porque eu apenas sei  - e me conforto - na ideia de que nos vimos em qualquer outro mundo e nos encontramos neste para que a vida seja mais cheia de cor.
Porque eu vivo nessa certeza incerta de que você sempre volta pra me ensinar a viver.



terça-feira, 14 de junho de 2016

Ambiguidade emocional - Um conto sobre Anna

Essa é a história de Anna.

Um tanto quanto intensa. Um tanto quanto apaixonada.
Anna conheceu Maurício em uma festa de natal da família de sua irmã. Os dois, que já haviam se visto em outras ocasiões, finalmente tiveram a oportunidade de conversar. Na varanda, entre um cigarro e outro, um beijo e um início aparentemente promissor. Dentre tantas afinidades, tantos gostos em comum, tanto conhecimento que surgira dali.
O problema de Anna não era Maurício. Maurício, na realidade - naquele momento - era solução.
Anna vinha calejada de um relacionamento confuso e complexo com Alex, rapaz intrigante, que a fizera desistir de seu antigo namoro, prometendo-lhe coisas que jamais poderia cumprir.
Alex e Maurício não eram nada parecidos.
Maurício sentia. Alex dissimulava. Maurício ensinava com a vida. Alex parecia não aprender nada com ela.
No ápice de sua estabilidade emocional, Anna viu-se novamente obrigada a lidar com um sentimento mal resolvido: Seu amor por Alex - ou o que ela pensava ser. Ele surgira na porta de seu trabalho alegando saudades depois de ver fotos da moça com seu novo amor. Ficara inquieto e decidira testá-la até os limites.
Anna, por incerteza, recebeu-o como um velho amigo. Juntos, se dirigiram a um bar próximo e falaram sobre a vida. Ela tentava provar ao rapaz a sua felicidade. Ele se aproveitava de sua evidente dúvida para dissuadi-la. E finalmente, um beijo quente aconteceu.
Antes fosse só mais um beijo, só mais um erro. Mas ela seguiu. Foi além.
Dado o primeiro ato falho, os outros viriam em sequência. Era uma breve questão de tempo.
Em questão de duas semanas, Anna viu-se mentindo para Maurício, alegando dormir na casa de uma amiga de colégio, para se encontrar com Alex.
Por descuido, acaso ou destino, Maurício finalmente descobriu. Chorou e se desesperou ao ver a namorada entrar no carro de Alex e dar-lhe um beijo intenso logo em seguida. O amor ali, acabou. Ou ao menos, pareceu acabar.
No dia seguinte, Maurício confrontou a moça, dizendo-lhe tudo o que havia visto na noite anterior e lhe contando sobre as suas especulações da madrugada. Anna apenas chorou. Maurício, que naquele exato momento por raiva, talvez a tivesse xingado, não o fez. Tratou-a com um respeito que ela jamais vira em Alex.
Maurício resolvera conversar junto ao rapaz por telefone para explicar sua ciência de tudo. E o choque de Anna foi descobrir que Alex não somente não tinha qualquer intenção de seguir adiante com ela, como colocara a responsabilidade de tudo em suas costas alegando que ela o havia procurado inúmeras vezes e que ele, por sua vez, resistira.
Ela bem conhecia as falhas de caráter de Alex, mas jamais pensou chegarem a tal extremo.
Finalmente percebera que deixara um grande homem partir magoado. Trocara o que desejava em sua vida, por um impulso - mais de um. Fora levada pelo desejo descontrolado até as últimas consequências. E agora descobrira que Maurício era de fato o grande amor de sua vida.

Anna desconstruiu todos os seus próprios conceitos. Seguiu sabendo que não desejava nunca mais ver Alex. E nunca mais veria.
Sofreu buscando o perdão de Maurício, que mesmo ainda cheio de amor, decidiu dois meses depois oferecer uma nova chance à uma colega de trabalho, com quem se dava extremamente bem - mas com quem jamais pensara em se envolver.
Anna entrou em período de reclusão. Foi injuriada pela maioria dos amigos de Maurício que sabiam boa parte de toda a história. Viu-se obrigada a suportar todo o tipo de piadas e ameaças, vindas de quem sequer compreendia seus pontos de vista. Entendeu que o ser humano, por natureza, julga. E que, para ser perdoada, ela precisava se perdoar.
Anna compreendeu que somente ela mesma entendia sua dor. E a aceitava.
Finalmente cansara de se justificar.